Silvestre I, romano de nascimento, era
filho de Rufino, duma família opulenta e muitíssimo considerada em Roma. Desde
a primeira idade, foi educado pelo padre Cirino, do qual nosso Santo imitou a
doutrina e as virtudes.
O maior prazer de Silvestre era acolher
os fiéis que apareciam em peregrinação às tumbas dos santos apóstolos:
conduzia-os à casa dos pais, lavava-lhes
os pés, dava-lhes de comer, e o que se fazia necessário.
Um destes peregrinos, São Timóteo, vindo
de Antioquia, fora martirizado; São Silvestre I arrebatou-lhe o corpo e
enterrou-o honrosamente.
São Silvestre mesmo, foi aprisionado
pelo prefeito de Roma, e destinado ao suplício último, quando a súbita morte
daquela autoridade lhe restituiu a liberdade.
Nosso Santo foi admitido no clero, e,
com a idade de trinta anos, o Papa São Marcelino o ordenou Padre. O cisma dos
donatistas dividia então a África, preparando-lhe a ruína final sob o ferro dos
vândalos e dos maometanos. Os cismáticos, para se dar um ar de catolicidade,
procuravam insinuar-se em Roma mesma, mas, como disse São Cipriano, a perfídia
ali não conseguiu ter acesso.
São Silvestre I, particularmente opôs
tenaz e corajosa resistência ao mal, arrasando intrigas, desmascarando
hipocrisias, refutando sofismas, sem se atemorizar com calúnias ou
perseguições, que lhe imputaram ou moveram. Toda a malícia usada, apenas serviu
para que melhor se conhecessem os méritos do grande Santo. E assim,
engrandecendo-se, com a morte do Santo padre Milcíades, em 314, São Silvestre
foi elevado, de comum acordo, unânimemente, à Cátedra de São Pedro.
Em meados do século XII, um patriarca
grego de Constantinopla, Germano II, contava ao patriarca da Armênia que o
imperador Constantino fora curado da lepra, recebendo o batismo do Papa São
Silvestre. O mesmo fato é contado no ofício romano e nos atos de São Silvestre
I, atos muito antigos, mas sobre a autoridade dos quais os sábios não estão
inteiramente de acordo. Eis como o Padre Croiset, jesuíta, o resume no Ano
Cristão.
Os atos do Santo, autorizados por grande
número de autores célebres, tanto gregos como latinos, e por uma venerável
tradição, dizem que o imperador Constantino, vendo-se coberto duma espécie de
lepra que era assaz comum naqueles idos, consultou todos os médicos tido como
hábeis no império, os quais, todos pagãos, acordaram que banhar-se no sangue de
criancinhas era o único remédio eficaz para aquela doença.
Por maior que fosse o desejo do príncipe
de se ver curado, maior ainda dói o horror de tal medicina: a estima que tinha
pela religião cristã, da qual então não possuía senão uma escassíssima tintura,
começava já a lhe inspirar sentimentos mais humanos, de modo que, aterrorizado,
se recusou a tão bárbaro banho.
Ora, na noite seguinte à da resposta dos
médicos, teve ele uma visão: em sonhos, viu dois venerabilíssimos anciãos, de
ar doce e majestoso a um só tempo ; aproximando-se dele, declaram-lhe como tal
ato de clemência agradara a Deus, que tudo vê e tudo sabe, acrescentando-lhe
que procurasse o soberano pontífice dos cristãos, chamado Silvestre.
Quando o santo pontífice viu que
oficiais do império vinham buscá-lo, não duvidou de que o fim estava próximo e
ia, assim, receber a palma do martírio. O príncipe, contudo, quando o santo
Pontífice chegou, recebeu-o com muita bondade e muitas honras. Contou-lhe da
visão que tivera e do conselho que lhe deram os dois venerabilíssimos velhos,
duma sobrenatural maneira, para obter a cura da lepra que lhe cobria o corpo.
São Silvestre, surpreso com aquela
magnífica acolhida por parte do imperador, mais ainda com o sonho que lhe vinha
de contar Constantino, disse ao príncipe:
- Não duvideis de que a visão que
tivestes veio de Deus. Os dois venerabilíssimos anciãos outros são senão os
dois esteios, as duas colunas mestras, os dois grandes apóstolos de Jesus
Cristo. Por estas imagens vereis quem são eles.
E, tendo-lhe mostrado as imagens de São
Pedro e São Paulo, o imperador Constantino, imediatamente, reconheceu os dois
anciãos da visão.
Grande mudança se deu então na alma do
bom príncipe: quis ser instruído a fundo nos mistérios de nossa religião. E a
graça, operando-lhe no coração, levou-o, pouco depois, a ser admitido no seio
dos catecúmenos.
A santa impaciência que o imperador
Constantino de ser cristão, obrigou São Silvestre I, a abreviar o tempo de
provas. Assim, solenemente, foi o príncipe batizado por nosso Santo.
Apenas recebeu as águas sagradas do
batismo, a lepra, desaparecida, mostrava que a alma lhe fora lavada de toda a
impureza.
Como era natural, erigiu-se grande
número de igrejas. O Papa São Silvestre I levantou uma em Roma, na casa dum de
seus padres, Equítio, do qual levou o nome por muito tempo. É a atual igreja de Santo
Estêvão do Monte. O Papa dotou-a duma
renda anual, advinda de terras, casas e jardins.
Diante de tal exemplo, o imperador
Constantino erigiu, em Roma, primeiramente a basílica que, de seu nome, sempre
tem sido chamada Constantiniana, ou igreja do Salvador, no palácio da
imperatriz Fausta, sua esposa, antes chamado a casa de Latrão, onde se deu o
concílio contra os donatistas. Como ali também havia um batistério, e os
batistérios ostentavam a imagem de São João Batista, chama-se ordinariamente
esta igreja de São João de Latrão.
É a principal igreja de Roma, e os Papas
nela residem por muitos séculos.
Constantino ergueu ainda em Roma, seis
outras igrejas: a de São Pedro, ou Vaticano, onde estava um templo dedicado a
Apolo, para honrar o ligar do martírio e a sepultura do príncipe dos apóstolos;
a de São Paulo, no lugar do martírio do imenso apóstolo; a da Santa Cruz, na
casa de Sessório, que se chama Santa Cruz de Jerusalém por causa duma porção da
verdadeira Cruz, que ali existe; a de Santa Inês, com um batistério, a pedido
da filha Constância, e de sua irmã, do mesmo nome, que foram batizadas por São
Silvestre I; a de São Lourenço, fora da cidade, no caminho de Tibur, no lugar
da sepultura deste mártir; a dos mártires São Marcelino e São Pedro, no lugar
chamado Entre-os-Dois-Loureiros, onde foi a sepultura de Santa Helena.
É de crer, segundo as antigas memórias
da Igreja romana, que Constantino doara a estas sete igrejas de Roma, em casas
e terras, não somente na Itália, mas ainda na África, na Grécia, no Egito e no
Oriente, vinte e sete mil setecentos e vinte e nove moedas de ouro de renda
anual.
Os antigos atos de São Silvestre I,
contam que o Santo confundiu, e por muitas vezes, os judeus, em presença mesma
do imperador. O cardeal Mai descobriu, citados pelos gregos, vários fragmentos
duma obra de São Silvestre I, desconhecida até então. É uma disputa do
pontífice com os judeus. Os fragmentos encontrados explicam, por comparações
tiradas da natureza, como, na pessoa de Jesus Cristo, a humanidade, sofreu,
enquanto a divindade permaneceu impassível.
Se alguém em pleno meio-dia, com o sol a
pino, quiser cortar uma árvore, não há de cortá-la com o sol a rodeá-la, e ao
machado, de todos os lados?
Sem dúvida. E pode dar-se que o sol seja cortado, ou
batido, já que rodeia a arvora de todos os lados? - Não.
Assim, no Cristo, o corpo é a arvora, o
machado é a Paixão e o sol a Divindade. O Cristo sofreu sem que a Divindade
experimentasse qualquer diminuição motivada pelo sofrimento.
À impiedade dos judeus, negando a
divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, sucedeu a heresia de Ário, a grande
heresia, depois do que surgiu o anticristianismo de Maomé.
Para condenar a impiedade de Ário, o
imperador Constantino e o Papa São Silvestre convocaram, em 325, um concílio
ecumênico em Nicéia, na Bitínia. Dizemos o imperador Constantino e o Papa São Silvestre
I, porque então ficou dito em todos os escritos na ação 18 do sexto concílio
geral, terceiro de Constantinopla. Se os historiadores silenciaram sobre a
cooperação do Papa, o fato não deixa de se menos certo.
Os bispos reuniram-se em Nicéia em número
de trezentos e dezoito, sem contas os padres, os diáconos e os acólitos.
Jamais se viu coisa semelhante ou se
imaginou. Era a elite da humanidade cristã prestes a resumir, num ato de fé e
de amor, a fé, a esperança, a sabedoria verdadeiras de todos os séculos
passados, presentes e futuros. Até lá, a elite da humanidade pagã, os
filósofos, muito haviam dissertado sobre Deus, e o conjunto das obras de Deus.
E, depois de séculos de dissertações, de arrazoados e de sutilidades, nem uma
verdade havia ainda sido definida de comum acordo, nem posta ao alcance do
comum dos homens.
Ora, o que não puderam realizar os
filósofos gregos depois de dez séculos, nem os filósofos da Índia em trinta ou
quarenta, realizá-lo-ão os pastores cristãos em poucos dias em Nicéia. Fá-lo-ão
malgrado todas as astúcias, todas as argúcias do filosofismo ariano, Fá-lo-ão
ao consignar no seu Credo a doutrina que vinham de confessar nas prisões, no
fundo das cavernas, diante dos tiranos e dos algozes que lhes haviam vazado os
olhos, queimado as mãos, cortado os jarretes; doutrina hereditária que haviam
recebido dos mártires, os mártires dos apóstolos, os apóstolos do Cristo, o
Cristo de Deus; e o Credo, que definia com maravilhosa precisão as verdade mais
sublimes, continuará, até o fim do mundo, e por todo o universo cristão, o
cântico popular de fé, de esperança e de amor.
Ademais, mostrava a Igreja católica como
a humanidade divinamente restabelecida na unidade, uma vez que tão augusta
assembléia era presidida pelo Vigário de Jesus Cristo, o sucessor de Pedro, o
Papa São Silvestre, na pessoa dos legados, Ósio, bispo de Cordona, e os padres
Viton e Vicente, do clero romano. O grego Gelásio de Cízico disse em claros
termos que Ósio da Espanha ali ocupava o lugar de Silvestre, bispo de Roma, com
os padres romanos Viton e Vicente. Além disso, o Papa São Júlio e os
historiadores gregos Sócrates e Sozômenes ensinam que, desde então, era regra
da Igreja não se dever celebrar concílio nem ordenar o que quer que fosse sem o
consentimento do bispo de Roma. (...)
É nesta qualidade de Vigário de Jesus
Cristo, de sucessor de São Pedro e de chefe de toda a Igreja católica, que o
Papa São Silvestre I, pelo concílio de Nicéia, confirmou o Símbolo e outros
decretos, como se vê na coleção dos concílios, É devido às mesmas prerrogativas
que os bispos do concílio de Arles, reunidos da Itália, da África, da Espanha e
da Gália contra os donatistas, com uma carta sinodal, que começa nestes termos:
Ao bem-amado Papa Silvestre: Marino,
Agrécio, etc, salvação eterna no Senhor. Unidos pelos laços da caridade e pela
unidade de nossa Mãe, a Igreja Católica, depois de terem sido conduzidos à
cidade de Arles pela vontade do piedosíssimo imperador, nós vos saudamos,
gloriosíssimo Papa, com a veneração que vos é devida. Toleramos homens violentos e perniciosos à lei e à
tradição. Mas a autoridade presente de nosso Deus, a tradição e a regra da
verdade refutaram-nos de tal sorte, que nos discursos que fazem, nas acusações
e nas provas nada há mais de consistente ou concorde. Eis porque, pelo
julgamento de Deus e da Igreja nossa Mãe, a qual conhece os seus e os aprova,
foram eles condenados, ou refutados. A condenação foi amais severa, e a nossa
alegria muito grande.
Depois acrescentaram:
Elaboramos diversos regulamentos, em
presença do Espírito Santo e de seus anjos, e segundo seus movimentos. Cremos
que devíamos escrever-vos, a fim de que, por vós, que presidis as maiores
dioceses, sejam elas notificadas, insinuadas a todos.
Quando se pensa que, continuamente e de todas
as partes do universo, chegam ao Santo Padre, o Papa, as mais difíceis questões
sobre o dogma, a moral, o governo da Igreja; que continuamente as portas do
inferno, os poderes inimigos, a infidelidade, a apostasia, as heresias, os
cimas procuram prevalecer contra a Cátedra onde se assenta o sucessor de São
Pedro, devemos exortar os católicos todos a que peçam, roguem, orem sem cessar
pelo Sumo Pontífice, a Deus, a Jesus Cristo, a Virgem Maria, a São Pedro e São
Paulo para que seja assistido de maneira toda especial num governo tão vasto e
difícil, do qual depende a salvação das almas, a conversão dos povos, a
salvação do mundo, enfim.
O Papa São Silvestre I, depois de ter
governado a Igreja de Deus por vinte e dois anos, morreu a 31 de dezembro de
335. Teve por sucessor o Papa São Marcos, que eleito a 18 de janeiro de 336,
morreu a 7 de outubro do mesmo ano. Depois do falecimento, a Cátedra apostólica
ficou vaga até 6 de fevereiro de 337, sendo então a ela elevado São Júlio.
(Vida de Santos, Padre Rohrbacher,
Volume XXII, p. 222 à 233)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui seu comentário