Irmã Ana Rafaela
Maragno, EP
Irmã Maria Pureza do Imaculado
Coração fora uma religiosa piedosa e observante de sua regra. Havia entrado
para o convento muito menina, com tão somente 15 anos, por uma concessão
extraordinária do senhor Bispo, e ali vivera mais de seis décadas. Toda a
comunidade a respeitara de maneira especial e, hoje, é venerada como uma
verdadeira santa.
Sua história é muito
interessante e bonita.
Havia nascido em uma família
muito abastada e seu nome de batismo era Madalena Maria. Única filha entre
cinco varões, a mãe se encantava com a pequena e o pai tinha denotada
predileção por aquela a quem chamava de “minha princesinha”.
Ora, tudo isso a tornou muito
vaidosa. Passava horas diante do espelho, penteando seus longos cabelos, loiros
e cacheados, alisando suas finas sobrancelhas ou apenas contemplando seus grandes
olhos azuis. Madalena cresceu muito mimada pela família, inclusive pelos
irmãos, e recebendo sempre elogios por sua inegável formosura: “Que menina
linda!”; “Que bonequinha!”; “Parece uma princesa!”.
Madalena ficou orgulhosa, arrogante
e egoísta. Às vezes se recordava das lições do Catecismo de sua Primeira
Comunhão, quando havia aprendido como a maior beleza de uma pessoa é a que
reflete a humildade da alma e a pureza do coração. Todavia, o espelho continuava
atraindo-a... e logo deixava de lado aqueles bons pensamentos para cair outra
vez na mais intensa vaidade.
Uma noite, porém, Madalena teve
um sonho. Sonhou que estava admirando-se no espelho e, de repente, sua imagem
se transformou na figura de um Anjo, olhando-a de modo severo. Assustada,
escutou uma voz firme:
— Madalena... Madalena... Por
que te preocupas tanto por tua aparência? O espelho é teu maior inimigo!
A menina se afastou daquele
objeto antes tão atraente, mas não podia tirar os olhos da imagem ali fixada. E
o Anjo continuou, já com fisionomia mais amena:
— Madalena, se tu queres ser
bela, sê pura! A pureza é a fonte de toda beleza!
Dizendo isso, desapareceu...
Madalena se despertou ofegante...
Que havia passado? Buscou o espelho e olhou-se, vendo só sua própria imagem! No
fundo da alma, compreendeu como seu orgulho e vaidade iam levá-la pelo mau
caminho.
No dia seguinte, quis fazer uma
visita às freiras do mosteiro de sua cidade, para pedir uma orientação. A madre
superiora a acolheu com bondade e lhe recomendou ter muita devoção a Nossa
Senhora, Rainha dos Anjos e Mãe Puríssima, pois ninguém na Terra havia sido tão
linda quanto Ela, justamente por sua pureza virginal.
Madalena levou a sério o conselho
da religiosa e sua vida mudou de maneira radical. Tornou-se humilde e
prestativa, ajudava a todos que a ela recorriam, e unicamente se olhava no
espelho o necessário para ter uma digna apresentação. Nasceu, então, em seu
coração o desejo de reparar as faltas anteriores. Decidiu ser religiosa e fez o
propósito de nunca mais olhar-se no espelho!
Vencendo vários obstáculos —
entre eles a incompreensão dos pais e sua pouca idade, a qual tornou necessária
uma autorização especial —, por fim conseguiu entrar nas paredes benditas do mosteiro,
onde almejava levar uma vida pura, humilde e virtuosa, e onde em nenhuma cela
havia espelho...
Ali recebeu o nome de Irmã
Maria Pureza do Imaculado Coração e cumpria seu propósito com perfeição.
Obediente e recolhida, quando tinha a função de pegar água na fonte para a
cozinha, o fazia com os olhos fechados, para não ver sua imagem refletida na
água. Ou se era designada para limpar a roupa do convento, evitava fitar-se nos
grandes tanques da lavanderia.
Sua devoção à Santíssima Virgem
era notória. Continuamente viam-na rezando aos pés das belas imagens de Maria
que havia na capela ou no claustro, sobretudo diante da do Imaculado Coração. Sempre
discreta e amável com as outras freiras, sua presença marcava a vida
comunitária. Por isso, depois de passados tantos anos, suas irmãs a respeitavam
como modelo de santidade.
Ela nem se dava conta, mas sua
fisionomia, pela prática da virtude, havia se tornado ainda mais bela! Seu
rosto possuía uma luminosidade antes inexistente e seus grandes olhos azuis, espelho
de sua alma pura, adquiriram uma profundidade nova, tornando-se mais formosos e
atraentes. Nem os anos conseguiram deteriorar aquela juvenil louçania, reflexo
de um virtuoso interior.
Entretanto, sua saúde começou a
debilitar-se com o tempo. Sem preocupar-se consigo mesma, seguia desempenhando
suas funções e cumprindo as obrigações com esmero e amor. Até que, estando quase
sem forças, viu-se obrigada a guardar repouso na enfermaria. Aproximava-se a
hora de prestar contas a Deus.
Pressentindo a chegada da
morte, já febril e extenuada, Irmã Maria Pureza pedia algo que as freiras,
ajoelhadas à sua cabeceira, não conseguiam entender. Pensavam estar ela
delirando e rezavam a oração dos agonizantes. Mas a doente seguia balbuciando algumas
curtas palavras.
Por fim uma jovem freira creu compreendê-la:
— Parece querer um espelho!
— Um espelho?! — exclamaram
todas.
Como alguém que havia vivido
tantos anos fugindo desse objeto podia pedi-lo na hora de morrer? Mesmo sem intuir
o motivo de tão inusitado pedido, a superiora decidiu atender ao desejo da
pobre moribunda. Mandou procurar um espelho e colocou-o nas mãos da enferma.
Ao sentir o peso do objeto, os
olhos de irmã Pureza se abriram, ergueu a cabeça e delineou um enorme sorriso.
Aquele milagroso espelho não refletia a fisionomia exausta da agonizante, mas
sim rosto luminoso de Maria Santíssima. Viera buscar a alma daquela que,
desapegando-se da própria beleza, havia se tornado digna de contemplar as
maravilhas celestiais.
Revista Arautos do Evangelho n. 109.jan 2011
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