• quarta-feira, 9 de julho de 2014

    O segundo pedido

    Frei Martinho, sacristão de um convento franciscano, na Itália, cumpria suas funções com a maior perfeição. Esmerava-se em deixar alvíssimas e bem engomadas as toalhas do altar. Nunca se via sequer um resto de cera ou de no presbitério, e os cálices e cibórios estavam sempre reluzentes.
    “A limpeza é o luxo do pobre”, dizia a si mesmo, enquanto trabalhava com redobrado empenho, por tratar-se do culto a Nosso Senhor. Na vida de voluntária pobreza, abraçada por amor a Ele, queria servi-Lo da forma mais excelente, pois, além do senso do dever, brilhava na alma de Frei Martinho uma profunda devoção a Jesus Eucarístico.
    Quando o sacristão terminava seus afazeres, dirigia-se invariavelmente aos pés do tabernáculo e ficava rezando, em colóquios íntimos com o Senhor. Às quintas-feiras, havia no convento Adoração solene ao Santíssimo Sacramento, e ele sempre conseguia organizar o serviço de forma a passar longo tempo ajoelhado aos pés do ostensório.
    Aproximava-se, por aqueles dias, a festa do Padroeiro do convento. Frei Martinho estava encarregado de preparar as alfaias litúrgicas e decorar a igreja para a Missa solene. Sempre ativo e dedicado, conseguira belas flores para ornar o altar, o que não era fácil naquela estação do ano.
    na noite anterior deixara tudo pronto para a Celebração. Queria ter nesse dia o mínimo possível de ocupações, pois assim poderia assistir à Santa Missa com maior recolhimento e receber mais fervorosamente Jesus em sua alma.
    Mas qual não foi sua surpresa quando o Padre Guardião o escalou para a função de esmoler naquela jornada festiva! Era preciso conseguir sem demora um reforço de provisões, pois a casa estava lotada: além dos frades vindos de outros conventos, havia um grupo de peregrinos carentes. E a despensa estava quase vazia... Corria-se o risco de servir um frugal almoço aos visitantes e despedi-los sem jantar.
    Como bom religioso, Frei Martinho obedeceu prontamente e com alegria. Apenas pedia a Nosso Senhor Sacramentado a graça de retornar a tempo para assistir à Missa da tarde e recebê-Lo em seu coração.
    Acompanhado por Frei Salomão, bateu de porta em porta durante várias horas. Porém, as almas caridosas pareciam ter desaparecido da região! Somente ganharam alguns velhos pãezinhos, não conseguiram sequer os legumes necessários para uma humilde sopa...
    Começava a cair a tarde quando entraram numa pequena capela próxima do lugar onde estavam. Ali pediram com muita confiança à Virgem Maria que os ajudasse não a obter os mantimentos necessários para a comunidade, mas também a retornar a tempo para assistir à Missa e receber o Corpo de Jesus.
    Pouco depois de recomeçarem seu trabalho, encontraram um camponês guiando uma pequena carroça, o qual, depois de cumprimentá-los com respeito e pedir-lhes a bênção, perguntou:
    Meus bons frades, os senhores parecem preocupados... Precisam de alguma ajuda?
    Frei Martinho explicou-lhe a dificuldade pela qual passavam, e logo o camponês deu a solução:
    — Vejam como Nossa Senhora é boa por fazer-me passar por esta rua justamente agora! Aqui está um saco com batatas, cenouras, rabanetes e tomates. E neste outro estão dois grandes pernis. Agora entendo por que não consegui vender tudo na feira... É que Nossa Senhora decidiu reservar isto para o convento. Pois bem, podem levar tudo. Dou de muito bom gosto.
    Os dois frades agradeceram de coração ao generoso camponês, prometeram-lhe orações por ele e sua família, e tomaram alegres o caminho de volta. Contudo, era longa a distância a percorrer e chegaram ao convento quase no fim da tarde. Entregaram as provisões ao irmão cozinheiro, limparam-se da poeira do caminho e rumaram apressadamente para a igreja, onde ainda ressoavam as melodias eucarísticas.
    Entretanto, a Missa havia terminado... Não tiveram sequer o consolo de receber a Comunhão! Nossa Senhora havia atendido tão generosamente o primeiro de seus pedidos. Por que não quisera fazer o mesmo com o segundo?
    Consternados, puseram-se de joelhos aos pés do tabernáculo e fizeram a Jesus um amoroso queixume:
    Senhor, por que nos abandonastes? Quanto queríamos participar desta Missa! Entretanto, por amor à obediência, ficamos privados de Vos receber na Eucaristia!
    Aos poucos, a igreja foi se esvaziando, mas os dois religiosos ficaram em oração. De repente, viram surgir no presbitério um varão alto, cheio de nobreza e com uma fisionomia reluzente.
    — A Rainha do Céu ouviu comprazida vossas súplicas — disse ele — e mandou-me para atendê-las. Ajoelhai-vos junto à mesa da Comunhão e preparai os vossos corações para receber dignamente seu Divino Filho.
    O Anjo de luz abriu o sacrário, tomou o cibório e ministrou-lhes a Sagrada Comunhão. Depois fez um curto ato de Adoração ao Santíssimo Sacramento, recolocou-O no tabernáculo, e desapareceu.

    Lágrimas de consolação corriam pelas faces de Frei Martinho e Frei Salomão. Depois de uma longa ação de graças, a mais abençoada de suas vidas, foram narrar ao Padre Guardião o acontecido. Este mandou tocar o sino para reunir os outros frades e dirigiram-se todos à capela do Santíssimo, a fim de agradecer a Deus tão insigne graça. E viram — oh maravilha! — que o Anjo havia deixado uma marca de sua passagem: em belíssimas letras douradas, as iniciais de Jesus e de Maria! 
    Irmã Ana Rafaela Maragno, EP - Revista arautos do Evangelho n.105 set 2010

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